quinta-feira, 6 de setembro de 2012

Aqueles momentos que nos ficam gravados

Teria 12 ou 13 anos, a passar de uma infância super protegida para a adolescência, numa escola pública de subúrbio, no início dos anos 80 em Portugal.
Era uma criança. Tudo era novo, ingénuo, inocente. A mãe do colega de carteira trabalhava na Rua Escura, vendedora, pensava eu. Na turma havia um único caso de pais divorciados, tão raro era que ainda hoje lembro serem os pais do Tobé. A escola não tinha aquecimento nem muros, traficava-se de tudo nos recreios, paredes meias com o bairro dos ciganos que nem sempre eram responsáveis pela fama que tinham. Nos intervalos íamos fumar para o café. Nos furos jogávamos bilhar.
O ambiente era pesado, tive momentos sobressaltados outros de quase terror, na inocência de betinho lançado ao mundo.
Para me reconfortar, lembro-me de olhar o horizonte, para os prédios da cidade ao longe, e pensar: o meu pai está ali, a trabalhar, está a olhar para as mesmas paredes que eu estou, vê as mesmas sombras que eu vejo, e o sol que me aquece é o mesmo que o aquece a ele. Nesses momentos sentia-me protegido, sentia-o perto, debaixo do mesmo sol que nos alumiava.
Anos mais tarde, queimei quilómetros de filme na minha Canon, em fotos de todas as cores, com mar, nuvens ou montanha sempre com o pôr do mesmo sol, como se fosse meu, como se fosse familiar.
Hoje vi-o do alto da ponte, a pôr-se no mar para lá do Cabedelo. Virei a cabeça no meio do trânsito, não resisti. Estava vermelho, das poeiras de um Setembro seco e quente.
Tenho a certeza que não fui o único a olhar o sol. Mais alguém pensou o mesmo, fotografou-o para guardar, para mostrar, para partilhar, para dizer que gosta, para dizer que se lembra ou, se calhar, só porque estava bonito. E ter-se-á reconfortado.

1 comentário:

  1. Dizem ser esse o motivo porque o trânsito abranda a atravessar a ponte.Já me apeteceu parar muitas vezes. Pena não haver onde.

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